segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Circo de praia



A luz forte ofusca a vista daqueles que ousam caminhar pelo vilarejo ao meio dia. O reflexo amarelo do sol vem da areia quente das dunas que alicerçam todo o vilarejo da Prainha do Canto Verde, localizada a 120km de Fortaleza, capital do Ceará. De dia, a comunidade silencia. À medida que o sol vai dando a trégua, a vila se transforma. O movimento aparece. As pessoas abrem as portas de suas casas, conversam nos alpendres, estiram-se nas redes. Bicicletas, pedestres, vendedores de churrasquinho e o tradicional racha no fim da tarde dão vida à comunidade.


 De passagem pela região, o circo Imperial aciona as caixas retumbantes que lhes garantem o público do espetáculo noturno. Era a terceira semana ali. O vento forte da Prainha do Canto Verde, além de alfinetar as canelas dos moradores com a chuva de areia todos os dias, também rasgara a lona principal do circo. Agora o trabalho diário dos integrantes era costurar o estrago natural. Enquanto não terminavam o serviço, os espetáculos seguiam sem a coberta. “Não é a primeira vez que isso acontece. Teve um tempo que ficamos 4 meses sem viajar porque não tínhamos lona. Fiquei aperreadinha”, desabafa Ana Jéssica, 16 anos.


O circo não tinha teto, só paredes. O alojamento dos 11 integrantes do circo era ali, num trailer improvisado. Os colchões ficavam sobre a areia das dunas, que forrava o chão para a labuta diária e o sono noturno, ao ar livre. “Vamos ficar mais uma semana aqui até terminar de costurar a lona. Temos que chegar no Córrego do Sal com o circo inteiro”, completa a menina referindo-se ao próximo destino da trupe.

Devido as dificuldades financeiras, a família já foi obrigada a vendar uma lona grande, de boa de qualidade fruto de um edital de incentivo a cultura. Se organizaram e compraram outra, que já mostrou sua fragilidade diante do vento do Canto Verde.


 O circo do município de Beberibe viaja pelo litoral cearense todas as férias escolares e fica, em média, 3 semanas em cada localidade. “Eu fico contando os dias para chegar as férias e sair viajando com o circo”, conta Daiane, 14 anos, responsável pelo número da torre e da corda suspensa. Latões, cordas, garrafas de vidro compõem o material artístico da “família real”. Rita de Cássia, 15 anos, se orgulha da habilidade com o corpo e a coordenação motora com os limões. Dançarina e malabarista, aprendeu a arte com os pais, que vem sendo repassada de geração em geração. Durante o dia, costumam ensaiar os números da noite. Daiane, se pudesse, aprenderia acrobacias aéreas em tecido. “Sinto que meu corpo já está preparado. É tão lindo!”, diz com o sorrido no rosto. 



 O ingresso do espetáculo custa R$ 2,00 e dura cerca de hora e meia. Palhaços, malabaristas, dançarinas e contorcionistas ocupam o palco central do Circo Imperial todas as noites, a partir das 20h30. Depois do Córrego do Sal, o destino é Guajiru, no município de Fortim. Sobre o destino mais ousado que fizeram, Jéssica responde com satisfação: “Já nos apresentamos em Natal, foi o canto mais longe que já fomos com o circo”, dispara.
O amor de Rita, Jéssica e Daiane pelo circo está estampado nos olhos, enquanto falam do trabalho pessoal. A “família real” segue pela estrada todos os anos, perpetuando a tradição familiar e levando a alegria para vilarejos carentes de entretenimento.


Conhecido como Nem,  apelido de infância, Júlio prepara a rede para a construção da tarrafa no alpendre de casa. São 22 anos de pesca e 42 de idade, desfrutando da tranquilidade, do vento, do sol e do mar da Prainha do Canto Verde.




sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Mimos para Sereia


 Dia 2 de fevereiro, Salvador, Rio Vermelho, 5h da manhã.





“Meu nome é Janaína. O mesmo nome da rainha do mar. Tenho muito orgulho de me chamar assim. Minha mãe é muito devota a ela. Todos os anos estamos aqui, com nosso presentes. Meu balaio já está pronto. Coloquei minha boneca, perfume, meu caderno da escola, flores. Vamos já pegar o barquinho e levar para Iemanjá!” 


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