terça-feira, 30 de agosto de 2011

O caribe pode ser econômico sim!



Todo aquele estereótipo construído pela mídia sobre o Caribe faz, em parte, algum sentido sim. Os mitos se comprovam. A areia branquíssima não esquenta, a água translúcida não esfria e o sol raras vezes se esconde nestes meses de agosto e setembro (também quando se esconde dá espaço para os não tão singelos furacões, comuns na região). Mas raras vezes se fala sobre as civilizações maias que ali habitaram e sobre as possibilidades econômicas de estadia. O Caribe mexicano é também parte da cultura daquele país e não se pode fechar os olhos para o apartheid que muitas vezes se implanta ali, entre a invasão turística e a população local, que pouco conseguiu preservar suas tradições na costa do estado de Quintana Roo. Muitos deixaram o litoral, outros se moldaram aos novos tipos de serviços ofertados pelos grandes investimentos como hotéis, restaurantes e parques de lazer. Outros vilarejos ainda resistem, mantém-se como comunidade pesqueira. É o caso de Punta Allen, localizado ao sul de Tulum, na península de Boca Paila, na Reserva Sian Ka´na Biosfera. Neste lugarejo eu não fui.

Mas muitos me falaram e acredito que vale a pena uma parada neste pico, já que as recomendações vieram de pessoas que sabiam o que eu procurava: sossego e natureza. Cheguei no Caribe por Tulum e de lá foi difícil sair. Foram 12 dias numa cabana na beira da praia. Pé na areia 24 horas. Muito sossego. Redes no meio do coqueiral, água de coco, churrasco, cerveja, alguns churros e conversa fiada com quem passava. Italianos, franceses, espanhóis, mexicanos, israelitas (estes sim, estão por toda parte). No período em que me hospedei na Playa esperanza (1) não passou nenhum gringo (eles devem preferir os resorts de Cancún).

Em 25 passos eu já estava no mar (ver a foto tirada da janela da minha cabana). Por isso tardei tanto em me mover mais que o necessário para comer, tomar banho de mar, deitar nas redes e tirar um cochilo na praia. Um dia joguei volley com a turma da Playa Esperanza, mas foi o máximo de esforço que fiz. Ah, também nadei um pouco, fazendo snorkel na barreira de corais situada há algunsmetros da minha cabana, na praia Paraíso. Descobri uma maravilha do Caribe que nunca tinha escutado falar: os cenotes. É uma espécie de grutas de calcário com água transparente e potável surgindo do solo, formando grandes piscinas naturais. Aqui a água é mais fria que no mar. Bom para se refrescar do calor sufocante de Tulum.



Da máquina de costura ao mar


No mesmo espaço onde se alugam as cabanas Playa Esperanza funciona uma escolinha de Kitesurf, Extreme Control. O dono é italiano e há 5 anos treinou Roberto para ser instrutor do seu negócio. O mexicano negro, de traços indígenas fortes, se adaptou bem a nova vida na beira da praia. Embora sinta falta do seu povoado, não pensa em retornar tão cedo. O mar se tornou lugar de energia vital, assim como sua maior fonte de renda. “Eu sou descendente maia”, assegura. Dzitox, seu povoado, pertence ao município de Valladolid, situada há 100km de Tulum. Além da língua maia, fala espanhol e inglês. Esta última aprendeu para dar aulas de Kite. Hoje mora em Tulum. Mas para viver com o pé na areia e tirar um bom salário, deu muito duro até abraçar o mar caribenho. Roberto tem 25 e antes de decidir descer para a praia, trabalhava numa fábrica em Valladolid. Disse que aprendeu a manusear máquinas de costuras com certa habilidade, mas ganhava somente um peso por peça costurada e não conseguia tirar mais que 800 pesos por mês. Durou pouco no emprego. Foi quando decidiu ir a Tulum. Começou trabalhando em hotéis, restaurantes, até conhecer Marcos e começar como assistente de instrutor de kite. Hoje domina a técnica e já é um deles. Na ausência do dono (2), cuida do ponto e organiza a rotatividade dos instrutores da escolinha. São 4 no total. “Cada instrutor tem a sua vez. Há uma rotatividade para todos se beneficiarem”, explica o jovem. Atualmente, chega a ganhar 10 mil pesos por mês, comissão mais o fixo. Logo que veio morar em Tulum, há 6 anos, lembra-se de situações engraçadas: “Eu lembro quando eu vi pela primeira vez as pessoas andando na praia com esses fones no ouvido. Eu não entendia, não sabia o que era. Foi engraçado!”


Buraco da Fechadura

Guia Por Onde Andei - Tulum

(1) Serviço: Cabanas, camping e redes para alugar. Playa Esperanza: situada na Praia Paraíso, Tulum. Cabana: 350 pesos para 2 pessoas. Rede e camping: 50 pesos por pessoa. Falar com Jamie (foto). Contatos: +52 19841453652 e jamie_luraschi@hotmail.com

(2) Geralmente quando Marcos não está em Tulum, está praticando Kitesurf em Jericoacoara. Ele estava indo para a terrinha em 15 dias. Não acreditou quando soube que eu era cearense e sempre ia por lá. “É raro vir cearenses por aqui”, disse. Em toda a viagem pelo México, foi a primeira vez que a Bahia e o Rio de Janeiro não foi o alvo dos holofotes estrangeiros no que diz respeito a Brasil. Em se tratando de esportes de vento, de fato, como Jeri não tem igual. Dale Ceará!


3 comentários:

  1. Oi Raquel,

    para mim o Caribe mexicano é o lugar onde estive em que se pode ver mais claramente a subserviência do país ao capital estrangeiro. É realmente chocante, um dos lugares mais lindos do México está entregue à especulação imobiliária e turística desenfreada, privatizando grande parte da costa (muitas das praias entre Tulum e Playa del Carmen são privadas, ainda que a constituição proiba o fechamento de qualquer parte do litoral). Ainda tenho no meu facebook fotos que fiz das casa em que vivem os migrantes de yucatán que vem trabalhar no Caribe, em geral choças de madeira ou, cada vez mais, condomínios de casas construídas onde antes estava a floresta. é deprimente. O salário médio nesta região é de 500 pesos aos mês, mas a imagem de que essa é uma terra de oportunidades segue atraindo centenas de yucatecos e chiapanecos para a costa (o que ajuda naturalmente a manter os salários baixos). Eles não tem absolutamente nehuma garantia de emprego, tanto que na época da influenza, em maio de 2009 (eu cheguei no caribe exatamente nesta época) milhares perderam o emprego do dia pra noite. Para muitos, foram seis meses de miséria.

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  2. De fato, é muito chocante ver um pedaço de terra tão lindo nas mãos de estrangeiros explorando a própria população local. Não sabia dessa média salarial. Já fiquei muito chocada com o trabalho de Roberto na fábrica que raras as vezes era que ele conseguia chegar a 800 pesos. Não consigo nem imaginar o que é trabalhar um mês para ganhar 500 pesos. Revoltante! Infelizmente isso não é um problema só do México, né, Cassandra. Parte do Nordeste brasileiro está se transformando nisso também. Iniciativas de organização de comunidades pesqueiras contra esse tipo de turismo devem ser louvadas como o caso da Prainha do Canto Verde, Ceará. Procure ver o trabalho deles, vc vai gostar. Tem várias coisas na net. http://prainhadocantoverde.org/

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  3. é, a selva lacandona de chiapas é um exemplo também, através de "ejidos", ou seja, da coletividade da comunidade, eles controlam tudo, desenvolveram um turismo sem agredir a natureza e a sua cultura. eles têm o controle de tudo, o dinheiro do turista vai diretamente pra eles, e é tudo muito justo! são lugares como esses que te dão um pouco de esperança, mas é foda mesmo saber que os poderosos vencem...o capitalismo selvagem cresce a cada dia mesmo.

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